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Belo Horizonte, Minas Gerais, Brazil
Fui promovido a escritor de quinta, quinta colocação em minha rua, mas também escrevo às quartas, terças etc.

Tradução/Translation

domingo, 21 de março de 2010

Outono


“São as águas de março

Fechando o verão

É a promessa de vida

No teu coração” (Tom Jobim)


Cai a primeira chuva, somente pra refrescar, pra inspirar, pra dizer que as chuvas nervosas passaram. Chuva abençoada e “a bem soada”, de fazer bem aos ouvidos, de fazer amar e de fazer dormir.

Outono no sul, primavera no norte. No meu coração, não sei se a estação muda. Mas voltei a sonhar, à espera de abril, o mês mais lindo. No norte e no sul.

Nem tudo são flores: algumas notícias ruins, alguma apreensão com o trabalho, a decepção de sempre com a educação. Sou um daqueles milhões de professores que não conseguiram mudar o mundo. Nem de profissão.

Porém, a época é de frutos: faço as pazes com as letras e comigo mesmo. Observo as quaresmeiras. Volto a minhas músicas de estimação, penso em tirar a poeira dos casacos, penso em iluminar e organizar as letras que me vêm, fazendo delas texto, tecido com a alma.

Não consegui me livrar ainda dos desejos vãos: o novo carro novo, o computador com mais memória do que carece, alguma silhueta levemente sinuosa, algum olhar oferecendo coisas ou gente, a comida além do que faz a maravilhosa máquina humana funcionar, um tantão de inutilidades das vitrines de verdade e de internet.

Entretanto, o que mais desejo neste outono é nada querer. Vou, antes, deixar chegar aos Céus minha gratidão, suplicar por mais sabedoria, por mais contentamento. Vou chorar o pranto dos excluídos, dos sem-teto, dos desprezados, dos que tiveram a terra a lhes tremer os pés e a lhes acinzentar o futuro, dos que debalde plantaram. Vou tentar sorrir para aqueles de que não sei o nome, depois de aprendê-lo.

Neste outono, sou terra a se fertilizar com o favor sempre presente de Deus, com o amor doce dos amigos, com o canto da natureza, com o encanto das crianças, com a transcendência da literatura. Sou folha em branco à espera de que nela se escreva um verso bonito.

Neste outono, quando eu abrir as janelas para o sol, abram-se também para a vida. E as portas, para os vizinhos. E as pontes – de concreto e de palavras – continuem a unir lugares e pessoas. E ainda: meus olhos não se fechem para um pedaço do mundo agora mais belo, iluminado, prenhe de esperança e feliz.

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