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Belo Horizonte, Minas Gerais, Brazil
Fui promovido a escritor de quinta, quinta colocação em minha rua, mas também escrevo às quartas, terças etc.

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terça-feira, 6 de julho de 2010

Sobre mim, sobre hoje e sobre Deus


Este fim de outono e começo de inverno tem sido um recesso literário para mim. Paralisam-me a Copa e a lembrança fresca do ser tosco que comandou nossa pretensa supremacia; o frio (que não fincava raízes em BH desde 1985); o novo apartamento, tão igual e tão diferente do antigo; e uma certa náusea de meu ofício de professor pouco ajustado de desajustados, em que se gasta 90% da energia com sermões às paredes e apenas 10% com a tentativa vã de ensinar.

Mas não perdi o encanto: pelas letras, mesmo que me fujam; pela cidade jovem que me acolheu, mesmo que me ressinta de não muita história em suas ruas; pela vida, mesmo que se apresse mais na idade média; pelas paixões, mesmo que sejam apenas isso - e tudo isso; pelo Mistério, mesmo que sua grandeza me humilhe ao tempo em que me ama.

Não perdi o encanto. Ainda existem as músicas, minhas três mulheres, meus parcos talentos, meus sonhos sobreviventes, minha esperança a requentar, páginas a escrever... Não perdi a fé, embora sofra com seu fogo tênue, que já me ardeu bem mais, como aos discípulos no caminho de Emaús. Embora ela, contraditória, me alimente de dúvidas, perplexidades, aparentes fracassos e lágrimas que, não raro, se escancaram. Não perdi também a sintonia com corações às vezes a falar por mim. Como neste texto de RICARDO GONDIM (sempre ele!) com que, árido, hoje me presenteio:

SOBRE DEUS

Não sei explicar as razões de minha fé. Não sei dizer os porquês de minha devoção. Sinto-me inadequado para convencer os indiferentes. Como fazer que desejem o mesmo sal que tempera o meu viver? Limitado, reconheço que tudo o que sei sobre o Divino é provisório. Não tenho como negar, minhas convicções vacilam. As certezas que me comovem são, decididamente, vagas.

Sei tão somente que Ele se tornou a minha meta, o meu norte, a minha nostalgia, o meu horizonte, o meu atracadouro. Empenhei o futuro para seguir os seus passos invisíveis. No dia em que o chamei de Senhor, a extensão do meu meridiano se alongou e os fragmentos de meu mapa existencial se encaixaram. Ao seu lado, caíram os tapumes da minha estrada e o ponteiro da minha bússola se imantou.

Sei tão somente que Ele se fez residente no campus dos meus pensamentos. Presente nos vôos da minha imaginação, transformou-se no mais doce ponto de minhas interrogações. Causa de toda inquietação, tornou-se a fonte de minha clarividência.

Sei tão somente que Ele se desfraldou como flâmula sobre meus ombros. Por amar tanto e tão formidavelmente, cilício, purgações, sacrifícios, tudo foi substituído por desassombro. No porão da tortura, nos suplícios culposos, achei um ambulatório, o seu regaço.

Livros contábeis, que registravam meus erros, foram rasgados. Encaro a eternidade com a sensação de que as sentenças estão suspensas. Já não fujo dEle como de um Átila. Eu o chamo de Clemente.

Sei tão somente que Ele ardeu o delicado filamento que acendeu a luz dos meus olhos. Ele foi o mourão que marcou o outeiro de minha alma; sou um jardim fechado. Ele é o badalo que dobra o sino do meu coração e o alforje onde guardo acertos e desacertos do meu destino.

Sei tão somente que Ele me fascina com a sua luz refratada em muitos matizes. Dele vem o encarnado que tinge a minha face com o rubor do sol. Seu amarelo me brinda com o açafrão do mistério transcendental. Vejo um roxo que me colore de púrpura real. Seu branco é lunar e me prateia. Seu preto me imprime de um nanquim celeste. Por sua causa, a minha alma espelha o azul dos oceanos virgens.

O que dizer de Deus? Tão pouco! Calado, só espero que o meu espanto celebre o tamanho da minha reverência.

Soli Deo Gloria

(retirado do sítio do autor, onde se encontram várias outras preciosidades:
www.ricardogondim.com.br)

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