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Belo Horizonte, Minas Gerais, Brazil
Fui promovido a escritor de quinta, quinta colocação em minha rua, mas também escrevo às quartas, terças etc.

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sábado, 11 de setembro de 2010

Futuro promissor

Era um homem aparentemente sem futuro. Se muito, tinha passado, mas daquele imperfeito, que a gramática chama de pretérito.

Tinha “pobrema”. Ou, para ser menos tosco, menos preconceituoso e mais específico, tinha problemas de aprendizagem: nasceu burro, não aprendeu nada e esqueceu a metade.

Gaguejava muito o nosso Toinzinho, apelido que ganhou – aliás, ganhar, exceto no esporte, não era um de seus pontos fracos – por ser neto de Tonhão e filho de Totonho. Um dos professores o chamava de Antônio ao cubo, mas ele não entendia xongas.

Uma das coisas que ganhou na vida foi na loteria, aos 22 anos. Uma bolada. Alguns empresários de sua pequena e pacata cidade o convenceram a criar um time de futebol e provê-lo de um treinador de renome. Contratou ainda meia dúzia de uma casta que é chamada de “ex-jogadores de futebol em atividade”, com idade na faixa dos 40, salários na faixa dos R$ 100 mil e soma de pensões alimentícias daí pra cima.

O time foi um fracasso e mal chegou à quarta divisão do futebol sergipano, que nem sei se existe. Passados cinco anos de sua fundação, Toinzinho vendeu suas parcas propriedades, indenizou alguns atletas mais “renomados” e quase jazeu afogado em dívidas.

A solução de alguns amigos para Toinzinho, aproveitando-se o que restava de sua popularidade, era ele entrar para a política, concorrendo de cara para deputado federal, num Estado vizinho. O lema da campanha, inventado por um maluco com pretensões de assessor, era: “Ruinzinho não! Toinzinho – tudo que ele ainda não fez deu certo”. Era uma afronta à sanidade e ao outro candidato forte da região, latifundiário de pequena estatura, Rui, chamado pelos inimigos de Ruinzinho.

Apesar das tentativas da oposição de impugnar sua candidatura, alegando que o lema seria um engodo, uma ofensa crimonosa, as promessas não seriam factíveis e o postulante à Câmara Federal seria um demente, além de mau administrador, os ataques baldaram em vão. A Justiça Eleitoral entendeu, de maneira judiciosa e ponderada, que

"não há nenhuma eiva de ilegalidade na cogitação de o candidato suposta e vagamente ser 'desmiolado', eis que não disponível tradução clara, na órbita do saber científico, para essa reles suposição nem respaldo na prova dos autos em que se pudesse arraigar um decreto de impugnação da candidatura. Esta, ademais, não ofendeu quem quer que seja, por ser público e notório, há décadas, o apelido da parte contrária, que nunca contra ele se insurgiu de maneira formal. Ao fim e ao cabo, a pecha de 'mau administrador', em se tratando da esfera privada, é irrevelante no caso em tela, pelo que não conheço da acusação, neste particular".

Demorô! Toinzinho, preparando-se para a propaganda política, ensaiava músicas, e não falas, para não gaguejar. Além disso, aprendeu palavras novas, com as quais entoava este jingle, encomendado a um marqueteiro capaz de tirar água da pedra:

É balbo mas não é ruinzinho
Seu lema tem profundidade
Gagueja, mas só um pouquinho
Vai ser bom pro Estado e para a cidade

Toinzinho é o meu deputado
E o povo assim também quis
Um-um-sete-um no teclado
O futuro é lindo, não tem que ser gris

Ainda bem que era "um-um-sete-um" no teclado, e não no Senado, onde só há figuras impolutas. E o infeliz, apesar do número suspeito, tinha o apoio do presidente da República, que estava acima do bem e do mal. Elegeu-se com muitas dezenas de milhares de votos. Chorou no discurso de posse, com quatro horas de duração, por motivos óbvios. Motivos óbvios para o choro ou para a demora?

Porém, ganhou na loteria de novo, com apenas sete meses de exercício "pra-lamentar". Sabe-se lá se foi sorte da genuína mesmo ou daquela encomendada. Mais grana que da primeira vez. Renunciou ao mandato para um suplente podre de rico assumir. Como a eleição, no mundo da fantasia, foi no segundo semestre de 2009, Toinzinho acaba de fundar uma empresa de marketing político, a prestar serviços para o Brasil inteiro. Contrariando toda a lógica, inclusive a da semântica e a da lógica propriamente dita, tudo indica que ele tenha um futuro promissor, expressão ainda mais maluca que esta história.

As más línguas lançam a suspeita – que este blog não endossa de que a empresa de nosso herói teria inventado alguns lemas esdrúxulos que se ouvem por aí. Como, por exemplo, o do PSC, que se diz cristão e, contraditoriamente, coloca o homem em primeiro lugar, desrespeitando o primeiro mandamento. Vai entender esses políticos!... Mas, graças ao Tiririca, "pió que tá num fica".

P.S. : A peça acima é um texto ficcional. Qualquer semelhança com alguma(s) pessoa(s) real(is), viva(s) ou morta(s), é coisa da cabeça de quem leu. O texto, à semelhança da prática partidária brasileira, não pretende ser "politicamente correto". –


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