Pesquisar neste blog

Quem sou eu

Minha foto
Belo Horizonte, Minas Gerais, Brazil
Fui promovido a escritor de quinta, quinta colocação em minha rua, mas também escrevo às quartas, terças etc.

Tradução/Translation

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Eleonora

Estudava Letras na UFMG e passava a pé, com frequência, em frente à Escola Municipal Prof.ª Eleonora Pieruccetti, Bairro Cachoeirinha, Belo Horizonte. Nos idos do início da década de 90. Desde a primeira vista, tive a impressão (ou a conviccção, sei lá) de que trabalharia ali.

Sempre quis ser professor. Em princípio, de Geografia. Eu via mapas até na hora de namorar, achava o máximo o fato de existirem fusos horários. Cheguei a decorar a renda per capita de dezenas de países. Isso, no entanto, somado ao fato de eu saber o nome da capital de Honduras, não tem a menor relevância. Mesmo assim continuo comprando o Almanaque Abril.

No final, vim a ser professor de Português e especialista em Conhecimentos Gerais, por culpa do Almanaque. No Eleonora. E nele - a gente trata assim, no masculino, deixando subentendida a palavra grupo ou ginásio -, um dos primeiros textos que levei a meus alunos foi “Das saudades que não tenho”, de Bartolomeu Campos Queirós. É bonito e introduzido assim: “Nasci com 57 anos”. Quase fui apedrejado.

Comecei, mesmo assim, a morrer de amores pela profissão e, ao mesmo tempo, a me decepcionar. Todo professor pensa ter o poder de mudar o mundo. Mas tem dia em que há dificuldade até para fazer chamada.

Descobri, com o tempo, que grande parte dos alunos de baixa renda aprendem pouco ou quase não aprendem. Também pudera: ensino fundamental noturno e jabuticaba só devem existir no Brasil.

Descobri, também, a falta que um pai nos faz. A grande maioria de meus alunos ou não sabe quem é o genitor; ou sabe e preferiria não saber; ou não tem uma boa imagem dele; ou desconfia de que sua vida não é uma das prioridades do pai; ou acha que foi um acidente da reprodução humana. Vivem sem pai, física ou emocionalmente. Vivem mal, portanto.

São boa gente, apesar de alguns serem mais chatos que aula de Português. No Eleonora não há violência significativa, não há o domínio do tráfico de drogas: apesar de o baseado rolar de vez em quando, há um relativo respeito pelos professores.

No Eleonora, recebo ajuda, carinho e compreensão de ótimos colegas. Alguns são grandes incentivadores de meu ofício de escritor, a partir de textos humorísticos cometidos por mim sobre nossos dramas, temas e dilemas escolares.

No Eleonora, fiz história, como esse pessoal aí da foto. Lá sou feliz, embora conviva com o drama social sem retoques do meu Brasil. Agora, seria ainda mais culpado se não fizer nada para mudá-lo. Guardo com ternura muitas das carinhas e pessoas sofridas que passaram por mim, esperando não ter passado por elas em vão.

Um comentário:

  1. Saudades. No Belo Horizonte de tantas histórias não tem a minha, pois a fiz e a deixei no Eleonora.Pra sempre. Beijos a todos.

    ResponderExcluir