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Belo Horizonte, Minas Gerais, Brazil
Fui promovido a escritor de quinta, quinta colocação em minha rua, mas também escrevo às quartas, terças etc.

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sábado, 7 de novembro de 2009

Microtratado sobre a frescura





Os atleticanos dizem que frescura é ser cruzeirense. É uma simplificação, pois a verdadeira arte da chatice sofisticada tem raízes fundas e efeitos colaterais além dos gramados, como tentarei mostrar aqui. Não se preocupe quem tenha até três ou quatro de todas as características abaixo. Para uma ligeira hipotermia há solução: uma semana intensiva de sauna dá jeito.

Pra começar, um indício – embora inofensivo – de frescura, como diz meu colega Marco Aurélio Bueno, é colocar underline no e-mail: dede_flores@bado.com. Não dá. Primeiro porque pedem para soletrar o underline. E segundo porque, quando o computador grifa tudo, o underline vai pro espaço.

Ainda preliminarmente, é sintoma frescural falar sílaba por sílaba como estava aquela festa porreta: ma-ra-vi-lho-sa! Frescura em gotas. E ter animal de estimação metrossexual? Frescura do cão. E falar a nojentinha palavra Orkut a toda hora? Freskut.

Por outro lado, ficar o tempo todo tagarelando ao celular em pé em ônibus suburbano na hora do rush é frescura proletária. Que, definitivamente, destoa por completo das outras manifestações de invernez, todas típicas da pequena burguesia. Esta transferiu à plebe, nos últimos anos, a primazia daquele artefato de comunicação inconveniente e brega, como diz outra colega, Sílvia Rachi. A tecnologia cafona (para usar uma gíria idosa) encontrou seu habitat.

Adjetivos e neologismo à parte, outro caso inconfundível de frescura – e, por que não dizer, de frieza – é o sujeito responder, ao telefone fixo, “com quem você quer falar?” à pergunta “quem está falando?”. Desde que o mundo é mundo, uma pergunta merece uma resposta, e não outro questionamento. Com o perdão de meu amigo Renato Costa, talvez também possam ter ancestrais na Groenlândia aquelas figuras que só comem salada na hora do almoço. E ainda ficam querendo levar os companheiros de trabalho para o mau caminho.

Faço um parêntese: ao contrário do que se possa imaginar, a classe aqui homenageada tem algumas vantagens comparativas em relação aos normais: o verão é mais ameno, o grupo de amigos é mais seleto (sem essa de gente comum, tropical) e, em geral, são mais magros do que quem não pertence à seita.

Agora vou ao âmago da questão: todo fresco é refrigerocêntrico, ou seja, a Terra gira em torno dele ou dela (a doença acomete mais as mulheres). Não somente a Terra, mas o sol, as outras estrelas, os olhares, a lua e toda a Via Láctea. É o jeito Gerald de ser. E, ao contrário dos seres-satélite, os frescomen ou as frescoroas só tomam refrigerante diet, light ou zero, mesmo que estejam magérrimos e com a glicose em jejum a 60 mg/dl.

Por fim, todo indivíduo polar – a saber, o que tem o mais grave ou a MAIORIA dos outros sintomas aqui elencados – sofre de inversão térmica quando lhe escancaramos, na lata, sua condição. Além de esquentar, fica vermelho. Pensa que sugerimos, preconceituosamente, alguma opção sexual. Não sabe distinguir clima de “pintou um clima”. A questão, como deixei claro no início, é bem mais complexa. Não me processem por frescofobia. O pinguim way of life – que as más línguas dizem ter começado a despontar para a glória na Paris do século XVIII –, portanto, desafia o tempo, o aquecimento global e extrapola gênero, sexo e tribos. Caminha para se tornar uma atitude globalizada. Uma manifestação meiga, pretensamente sutil e que se torna contagiosa. E crônica.

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