Pesquisar neste blog

Quem sou eu

Minha foto
Belo Horizonte, Minas Gerais, Brazil
Fui promovido a escritor de quinta, quinta colocação em minha rua, mas também escrevo às quartas, terças etc.

Tradução/Translation

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Desejos de Natal


Neste Natal eu queria voltar no tempo de apenas um radinho de pilha – que custou muito ao meu pai – fazer-me tão feliz. Eu queria ser criança de novo, ser simples como eu era, respirar ingenuidade, encher-me de esperança. Eu queria de novo a minha rua Sílvio Romero tão pacata, tão humilde, de vizinhos tão solidários e amáveis.

Neste Natal eu queria exibir a conquista que demora um ano na rua cheia de bicicletas, patinetes, bonecas, jogos, sorrisos, abraços e comunhão.
Eu queria que fosse um Natal de chuva, como tantos são, para que pudesse, entre outras estripulias, colocar os pés na enxurrada, molhar o corpo, lavar a alma, sair desse estilo de sapato e calça social que tanto me afasta daquele tempo em que eu começava a não saber ao certo quem era – e até hoje não descobri direito.

Era um tempo de procura e importava mais tentar que conseguir, mais sonhar que viver, antes brincar que aprender. Mas era bom aprender também: na escola, nas peladas na rua, nas minhas pelejas compulsórias com o jardim e a horta, nos meus amores platônicos, nas minhas experiências sinistras ao lado do Paulinho e de nossos grilhos transplantados. E confesso um pequeno vício: meus tragos emancipativos em cigarros de talo de pé de chuchu. Naquele tempo havia quintais. Fumar era chique. E pé de chuchu, verdura com 85% de água, só prestava – ou não prestava – para aqueles ensaios de ser gente grande.

Existiam, ainda, os carrinhos de rolemã, a oitava maravilha do mundo antigo. Cada um construía o seu, cada um se esfolava a sua maneira, cada um corria (literalmente) atrás do prejuízo de subir a ladeira íngreme carregando aquele trambolho – e muitas vezes algumas feridas.

Mas saiamos das lucubrações e do automobilismo de periferia. Voltemos aos natais: pernil na mesa, farofa, vinho barato, Guaraná Alterosa, champanha falsificado, hoje conhecido como cidra, alegria, noite feliz. Na TV, aqueles filminhos de sempre, com neve e papai noel em preto e branco. Ou, às vezes, toscamente colorido: algum iluminado dava um
up grade na televisão General Eletric, colocando uma espécie de filme de radiografia mais alegrinho, às vezes tricolor. Ninguém é perfeito.

Já nem vão longe estas linhas e meus desejos de pretérito se esgotam. Nada será como antes. As coisas melhoraram demais, embora às vezes eu desconfie que possam ter melhorado para pior. Os natais podem estar perdendo a graça e eu começo a desconfiar de que Natal de pobre é que é bom.

Aliás, o Natal só existe por causa de um pobre, ou melhor, de um Rei que se desfez de tudo para nascer, viver e morrer por nós. Alguém que abriu mão do poder para expirar, no instante do abandono de Deus, para que tivéssemos vida – vida que Ele conquistou lavando-nos com seu sangue e vencendo a maldição da rebeldia contra o Criador e da finitude que se abatera sobre a raça humana.

Eu tenho tantos desejos. Ele teve somente um:
“Pai, afasta de mim esse cálice”. O Pai se calou. Ele foi entregue por nós. Isaías, um dos primeiros a vislumbrar o grande presente de Natal, escreveu, com sofrido lirismo, sobre seu fim: O castigo que nos traz a paz estava sobre Ele. A paz – eis uma ótima dádiva! Príncipe da Paz, eis alguém a me dizer: melhor que me deliciar com o passado é ter esperança num futuro ainda melhor. Feliz Natal!

Nenhum comentário:

Postar um comentário