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Belo Horizonte, Minas Gerais, Brazil
Fui promovido a escritor de quinta, quinta colocação em minha rua, mas também escrevo às quartas, terças etc.

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quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Sobre o silêncio

Meus alunos, quase todos entre os mais jovens, abominam o silêncio. Na falta de conversa proveitosa, soltam uma piada sem graça, um palavrão, perguntam se é pra copiar, se vou dar visto. Ou colocam o fone de ouvido no órgão que parece doer se não estiver captando alguma coisa.

A ausência de ruído pode ser, de fato, incômoda, sobretudo para uma geração nascida após a palavra “irreverência” ter se tornado qualidade. A concentração exigida pelos estudos foi jogada às traças. Não se tem mais noção de comedimento, compostura, solenidade. Tanto é que um dia desses não passou de 20 segundos a duração do “minuto de silêncio” decretado por um árbitro de futebol.

Diante da ausência de som, somos impelidos a pensar, o que também parece não ser algo indolor para a criançada e a juventude. Somos levados, às vezes, a refletir – o que é exatamente o contrário de escutar Rebolation ou outras absurdidades. O silêncio nos leva, ainda, à contemplação, à introspecção, verdadeiros luxos da alma, quase relíquias, das quais, no entanto, abrimos mão pelo frisson às vezes idiota da vida moderna.

O silêncio nos traz de volta a nós mesmos – e talvez por isso não o queiramos cultivar. Encontrar-nos por dentro, e não somente no espelho, requer providências de que escovas, chuveiros, cremes, perfumes e bisturis não dão conta. Por essas e outras, ainda que o espelho por enquanto lhes sorria, incomoda-me não insistir mais em apresentar o silêncio aos meus alunos. É mais útil que censurar o “isso é para mim fazer” ou a “sombrancela”.

Controlar-lhes o impulso de falar – ou ouvir – futilidades, obscenidades, preconceitos e desgentilezas pode ser um grande passo no processo de se tornarem gente, que a escola abdicou de coadjuvar, quando a família lidera, ou mesmo de protagonizar.

Fiquei na dúvida se a palavra “desgentilezas” habita os dicionários, embora já esteja, timidamente, no universo do Google. Caso não exista, proponho-me a adotá-la e a combater sua prática, ajudar no seu processo de incorporação gradual ao léxico. Adoto também o silêncio, aquele absoluto, prazeroso, improvável. Farei o possível para que, retornando a minha vida, volte à sala de aula, de onde nunca deveria ter saído.

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