Um texto no futuro

Lola, enviada especial deste blog ao ano de 2050, conta que o Rio de Janeiro continua lindo. Sobretudo depois de as filhas voltarem a viver lá, nas adjacências bucólicas da Guanabara. Foram mais de duas décadas mundo afora, em nome da arte, do amor e das esperanças.

O Brasil parece ser, pelo seu relato, não uma incomparável potência econômica, mas a antessala do paraíso, a superar as melhores profecias lulistas: as pessoas, a duras penas, aprenderam a partilhar. Já não existem favelas na Cidade Maravilhosa. Os históricos morros foram de certa maneira urbanizados. O Cristo Redentor agora é giratório, não voltando as costas para regiões anteriormente menos abençoadas.

O aeroporto do Galeão, segundo minha amiga, passou a ser, naquele ano do futuro em que se realizou a terceira Copa do Mundo no Brasil, o mais movimentado do planeta. Ficaram para trás o de Frankfurt; Heathrow, em Londres; o de Chicago; o JFK, em Nova York; Narita, no Japão; e o de Beijing, entre outros. As pessoas atravessam o mundo e os céus em busca de conviver, nem que seja por uma semana, com o povo mais feliz da Terra, grande parte do qual agora se expressa com fluência em inglês, espanhol e mandarim. E para admirar, principalmente, o trecho de praias do Leme ao Pontal. Como cantava Tim Maia, não há nada igual.

Embora não seja preciso sair daquele Rio para nada, de lá partem trens-bala para São Paulo, Campinas, Curitiba, Belo Horizonte (a terra de nossa jornalista), em breve com extensão até Brasília. Esta última cidade, no entanto, passa por uma fase de decadência, depois de boa parte da Administração Pública Federal voltar ao Rio de Janeiro, no início dos anos 40.

Ao contrário da Capital do Planalto, a fluminense vive seu esplendor. Tramita na Câmara Municipal um projeto de lei, apoiado pela quase-totalidade da população, transformando o nome da cidade para Vilarejo. Isso apesar de, incluindo os municípios contíguos, a metrópole já contar com cerca de 19 milhões de habitantes, rivalizando com a Cidade do México no topo das maiores áreas urbanas da América Latina.

Explico o lirismo, que remonta aos tempos da bossa nova: após décadas de domínio da Dinamarca e de Butão no ranking das nações em que as pessoas são mais contentes, o Brasil passou a disputar essa liderança, em parte pela inspiração que Copacabana, Ipanema, Leblon e seus arredores produzem nos patrícios. O novo nome é homenagem a uma música da carioca Marisa Monte, de passagem discreta pelas “paradas de sucesso” na primeira década do século. Tempos depois, no entanto, a canção passou a simbolizar um país bem resolvido, socialmente bonito, não violento, ambientalmente correto, liberto de seus fantasmas. Uma nação a descobrir, muito além das enormes reservas internacionais e do prestígio que passou a acumular, um projeto de lugar bom para toda a sua gente.

A correspondente manda, com os registros que aqui tento sintetizar, uma foto com suas “meninas”, nascidas além-mar, mas de coração brasileiro. Nem parece ter a mãe bastantes quilômetros a mais de estrada. Continua bela, à semelhança das herdeiras de seu talento e assim como a cidade que elegeu. Credita seu jeito Highlander ao fato de ter ouvido, durante a vida, até não mais poder, três músicas intituladas Forever Young: uma de Bob Dylan; outra da banda Alphaville, na Alemanha onde viveu muito tempo; e uma terceira – não menos interessante –, de Rod Stewart.

Brincadeiras à parte, há indícios de que a forma de vovó Lola seja fruto de hábitos saudáveis, aliados a um elixir poderoso extraído dos ensinamentos de uma certa Dr.ª Zoe Diana Draelos. Este sedentário hiperativo, a passos largos rumo às noventa primaveras (com poucos disfarces), morre de inveja santa dessa inusitada parceria com o tempo e com o sonho. E diz amém.